Saga escaldante

refrescando

Aqui na cidade de Oz arde o asfato, pinga o suor, pinica a derme. Respirar torna-se uma atividade cada vez mais difícil. Sair a rua sem a proteção dos óculos de sol virou risco de cegueira tamanha a intensidade da luz solar. Permanecer dentro de casa transformou-se num fardo. Transito por entre os cômodos da casa. Nada está bom! Sinto como se atravessasse o corredor do subsolo do inferno. Ando descalça na vã tentativa de refrescar meus pés mas constato que piso em grelhas fumegantes. E olha que o piso de minha casa é de piso frio. Sorrio da ironia da coisa. E pra completar, minha irmã está na sala curtindo um vídeo da Fernanda Abreu “Rio 40 graus”. Há!Há!

Encontro-me numa malemolência de dar nos nervos. Mas até pra ficar irritada estou sem energia. Levanto da minha cadeira ergométrica de courino com a bunda pra lá de esquentada. Tudo gruda! Sigo para a cozinha para tomar um enézimo copo d’água. Por Deus! Está morna! Acreditem, até a parede da geladeira se encontra quente. Abro o freezer e pego mais um picolé para me refrescar. Ah! Que prazer! Mas dura pouco. Bem pouco! Em minutos o picolé se transforma num caldo grosso escorrendo pelas minhas mãos me lambuzando toda. Começo a me lamber inteira pois não quero perder um tico dessa gostosura que um dia foi gelado. Desânimo.

Retorno a minha cadeira e tento continuar a escrita que comecei. Está complicado manter uma certa coerência de idéias pois esse calor embota minha linha de raciocínio. Acredito até que estou escrevendo um monte de asneiras desconexas. Paro e olho para o circulador de ar que está ligado em minha direção. Cadê seu vento? Juro que não sinto. Me aproximo e quase entro dentro dele. Quero refresco! Desisto.

Levanto e sigo para fora de casa. Olho o jardim que pede urgente minha atenção. Sempre gostei de podar as plantas, tirar as daninhas, remexer a terra. Já sei! Vou trabalhar um pouco nelas. Devotar carinho e atenção para meu jardim tão lindo que hoje mais parece um trecho da Mata Atlântica. Pego minha maleta de jardinagem, visto as luvas, ponho meu chapéu, passo o protetor solar fator 60 e coloco os óculos de sol. Pronto! Paramentada para essa nova incursão.

Em poucos minutos sou pura água se desfazendo naquele solo árido. Encharcada de suor, salgada e azeda de tanta raiva, me jogo ao solo e começo a chorar. Minhas lágrimas saem quentes e queimam meu rosto já castigado pelo sol e suor. Sinto-me defumada!

Mais uma missão boicotada por esse maldito calor! Com muita dificuldade, guardo as ferramentas na maleta, junto os poucos galhos que podei, deixo num canto do jardim para murcharem feito eu pra depois mandar embora.

Entro apressada em casa. Quero banho! Droga de vida! Tem gente no banheiro! Espero.

Pego meus pertences de banho: xampú, hidratante de cabelos, hidratante para o corpo, meu sabonete líquido esfoliante. Quero dar um jeito de esfregar até retirar esse grosso do sal na pele.

O chuveiro está no frio e a água sai morna, quase quente. Me frustro mais uma vez. Faço todo o meu ritual de banho sonhando com uma água gelada de cachoeira escorrendo pelo meu corpo. Fica só na saudade!

Terminado o banho, fecho a torneira pois com tudo isso, ainda tenho consciência de que devemos racionar a água que já está quase a zero nos mananciais. Preocupação!

Se secar é quase que missão impossível pois é passar a toalha e minar o suor novamente por todo o corpo. Desisto. Passo o hidratante no corpo e ele passa a ser uma mistura de suor e creme. Estou toda lambuzada de novo!

21h. Quarto abafado, paredes mornas, piso morno, janela arreganhada e muitos pernilongos me visitando. Ventilador está até rouco de tanto trabalhar diuturnamente. Pede arrego. Não dou!

Estou só de sutiã e calcinha e já, já tiro isso também. Logo inicia-se minha tortura noturna do mês inteiro: tentar dormir.

Tento ler,não tenho concentração. Ligo a TV, uma droga de programação.

Apago a luz na vã tentativa de mais uma noite dormir bem.

Uma orquestra de pernilongos inicia sua cantoria em meus ouvidos.

O ciclo se inicia.

12 comentários sobre “Saga escaldante

  1. Roseli, kkk! O pior é que isso é geral. A gente acaba de tomar um copo de água gelada e em seguida começa a suar e perde dois copos de suor. A melhor solução é a de arrumar uma indumentária igual à da moçoila da figura. Só assim mesmo. De resto, você escreveu tão bem essa nossa saga que quem está lendo no inverno vai acabar sentindo calor também.
    Um beijo,
    Manoel

    • Manoel o bicho está pegando! Aqui em Osasco, minha terra que costumo chamar carinhosamente de Oz, está literalmente um inferno viu! Isso mexe com a gente que só. Mas o calor humano de vocês leitores é sempre bem vindo. Beijos

  2. Pois é, Roseli, desde ontem o calor deu uma “mini” trégua aqui no Rio (pelo menos na Zona Sul) e a temperatura tem caído para 23º durante a noite (além de uma brisa deliciosa que entra pelas janelas escancaradas). Mas o pessoal da meteorologia não desiste e garante que esse calorão vai até 15 de fevereiro… Fico aqui pensando se já não estamos colhendo os frutos de nossa imprevidência com o clima. Beijão.

    • Emerson, com certeza estamos colhendo os frutos dessa nossa irresponsabilidade. Pena que a maioria não tem ainda consciência disso. Obrigada pela visita e comentário.É sempre bom receber você por aqui. Beijos

  3. Pelo menos o calor não afetou o humor. Eu, que sou do frio, fixo com a pressão abaixo da crítica com o clima. Mas confesso: a falta de chuva anima meu espírito ciclista. Grande post, como sempre. E, esse especialmente engraçado.

    • Mariel, como diz o ditado: o jeito é rir pra não chorar. Amo o verão mas esse calor está tirando (quase) o meu humor. Principalmente a noite pois preciso dormir oito horas para acordar bem. Há quase dois meses não sei o que é dormir bem. Ai, ai! Ainda não sei andar de bicicleta. Acho que ainda está em tempo de aprender né? Está em meus planos. Mas antes precisa baixar esse calor! rsrs

  4. Roseli,

    Li de uma ponta à outra com um certo pensamento a aflorar:
    E que tal uma troca de continente por alguns dias? 🙂
    Deste lado do oceano são temporais, temperaturas em queda, neve e vento gelado…
    Adorei a escrita!
    Abraço!

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