Desejo de Natal: uma fábula diferente (ou não)

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Estou aqui, parada de frente a tela do computador há tempos, querendo escrever uma mensagem de Natal. Simplesmente não consigo!

O famoso e conhecido espírito natalino não baixou em mim esse ano. Aliás, o processo já vem ocorrendo há alguns anos mas agora, se materializou de vez.

Calma. Já explico. Espere, não vá tirando conclusões precipitadas. Hei! Não deixei de ser cristã não! Pode parar de me julgar sua falsa! O que? Não disfarça não que eu vi você fazendo sinal da cruz e falando em voz baixa que eu devo arder no fogo do inferno!

Vai me deixar explicar ou não? Voltem a se sentar que eu explico. Isso…Silêncio que a titia vai falar: Assim como nosso mano maior..

Oh dona Maricota, você aí de blusinha quadrada e estampadinha de rosa, para de cochichar com a sua comadre do lado. Eu estou falando. Então, ando tão decepcionada com a humanidade quanto Jesus, esse mesmo menino que nasceu na manjedoura e que comemoramos seu nascimento no dia 25 de dezembro. Lembrou agora o porque da comemoração? Ou ainda acha que é só por conta de ganhar presentes e encher a pança de guloseimas?

E digo mais: outro dia, num papo reto via skype angelical, ele me confidenciou a sua decepção com a gente e confessou que se soubesse que sua vida, dedicação e morte daria nisso, ele teria se arrumado com Madalena, enchido o planeta de filhos bonitos como ele, feito churrasco todo domingo na lage e comandaria a marcenaria do seu pai após esse se aposentar. Ah! E teria entrado numa briga boa com seus irmãos pela herança deixada pelo velho José.

Me disse mais: Já foi convocado pelo Senhor do Universo para retornar ao planeta e tentar trazer a humanidade para o caminho certo. Mandou uma figa para seu Senhor e jurou por tudo que é mais sagrado que não retorna jamais! Que mande outro otário! Eu heim? Sofrer a toa e nem ser reconhecido nas redes sociais!

Pensei muito sobre seu desabafo e concordo. Eu, em seu lugar, faria o mesmo. Apesar de ser uma otimista por natureza, não boto minha mão no fogo por essa humanidade desprovida de amor ao próximo.

Mas aí falei para ele: Mano, mas então, como fica o caso das pessoas de bem misturadas a essas criaturas tão sem lei, sem caráter que inundam e entristecem o planeta? É justo? Tantos inocentes morrerem porque existe um tabuleiro dividindo o planeta…Tanta violência…Tantas crianças orfãs…

Ah querida, agora pegou pesado comigo não? Sabe que meu ponto fraco são as criancinhas…

Mas não adianta. Nem por elas eu retorno! Pra mim basta.

Certo. Entendi. Nem pretendo te jogar nessa furada de novo. Mas então, vamos pensar em algo que possamos fazer para reverter esse quadro tão negro que atravessamos…

Eh…Que baita lorota essa aí tá falando. Aff!

Quem disse isso? Hã? Manifeste-se. Ah, é você? Seu Aureliano, paciência e ouvidos de ouvinte são bem vindos por aqui, ok? Não estou agradando? Olha lá que porta linda te espera. Raspe! Silêncio que eu vou terminar. Paciência. Lembram?

Após um silêncio profundo tanto na platéia que me ouvia quanto no recinto em que confabulava com J.C., ele levantou seus lindos porém cansados olhos e sentenciou:

-Roseli, não existe um outro caminho para a humanidade a não ser aquele que já mostrei. Somente através do amor, somente através de mim é que todos, sem exceção, encontrarão a tão almejada paz. E reforço que não será através desse amor doentio e dessa fé cega que se chegará a isso. Fé cega foi justamente a minha perdição. Não por mérito meu mas, da cegueira de toda a humanidade em que estive inserido na época. E vejo que nada mudou desde então a não ser a tecnologia que se usa hoje.

Passe a seguinte mensagem de Natal para seus leitores e demais pessoas:

Esqueçam essa correria abestalhada pelo consumo descontrolado. Ele é bom mas tem de saber usar. Controlem suas bocas para não pecarem na gula. Isso é pecado mortal Lembram? Busquem se aconchegar em seus lares olhando-se nos olhos, abraçando-se, acarinhando seus entes queridos. Mas não fiquem somente no seio familiar. Estendam esse sentimento para seus vizinhos, amigos, colegas, conhecidos e desconhecidos. Aprendam a amar de verdade. esqueçam o sentimento plastificado divulgado pela Plin-Plin e amem-se pra valer. Façam desse Natal, um divisor de águas e fará do ano de 2017 toda a diferença.

Roseli, passa essa minha mensagem exatamente assim. Ah, e antes que eu me vá, pode jurar de pé junto que euzinho não retorno aqui nem por Deus! Ai, meu Deus, perdoa-me disse seu nome em vão! Fuiiiiii!

Então galera do bem, é através dessa fábula diferentona que desejo um Feliz e Verdadeiro Natal a todos que por aqui passam. E aproveito e peço um favor a todos: colaborem com Mano Véio. Vamos fazer nossa parte porque…Esqueçam! Ele não volta nunca mais para botar ordem nessa zueira que fizemos! Vamos começar a organizar essa bagunça desde já.

Oh…dona Maricota, comece você a fincar ordem ao seu redor. Fazfavor! Jogue seu lixinho no lixo! Entendeu? Eu vi daqui você comendo doce e jogando embalagem debaixo de sua cadeira.

Ai Cristo como é difícil viu! Ah tá! Entendi. É para eu parar de reclamar também né. Ok! Não precisa me dar paulistinha na orelha. Olha a violência hein? Fuiiii também!

 

 

 

FELIZ NATAL PESSOAL!!!

Imagem: Barry Meyer

Era uma vez, outra vez

Abelarda retornou aos seus aposentos intrigada com a constatação do misterioso sumiço de Alfredo Augusto. Havia planejado nos mínimos detalhes seu fim, mas, tomada pelos afazeres reais e a visita inesperada dos representantes do reino Já Era, acabou por se envolver pela simpatia deles e sua doce vingança acabou por cair no esquecimento. Também pudera, Alfredinho sempre tão inexpressivo, apagado, destituído de atitude, transformou-se em polaroid esquecido num velho baú.
Mas se meu plano não foi posto em prática, o que poderá ter acontecido com ele? Será que aquele desmiolado se perdeu por entre os labirintos do castelo? Não é de se duvidar! Bem que aprecio a ideia de ser a mais nova viúva da região. Apesar de um pouco acima do peso, ainda sou uma bela e interessante mulher. Estou viva e tenho interesses num futuro mais brilhante que ser sombra de um reino pequeno feito essa Pedra Ilustrata. Quero mais! Mereço mais!
Com esse pensamento, Abelarda passou a sonhar acordada com um poder maior num reino distante e mais rico ao lado de um rei de personalidade assim como ela. Apesar da idade e da postura um tanto masculina, no fundo, alimentava o sonho de um casamento feliz ao lado de um homem de fibra que tomasse as rédeas ao seu lado no comando de um povo mais interessante que aquele. Silenciosamente achava-os provincianos demais.
Após passar a tarde inteira ruminando tais pensamentos, decidiu por mudanças de estilo de vida e de hábitos.
Olhando-se no imenso espelho, certificava o que precisava mudar em seu corpo para parecer mais sedutora. Esticava o pescoço para perder um pouco da papada, puxava a pele do rosto para sumir as rugas de expressão, desmanchou o coque que sempre usava e deixou que seus cabelos se transformassem numa grande cortina que já se mostravam grisalhos.
-Rosalinaaaaaaaaa! – vociferou
Num segundo, surgiu na porta uma serviçal.
-Vossa alteza chamou?
O que você acha estrupício? Vá logo buscar o catálogo de cores da tintura luz intensa. É pra ontem ouviu bem? Voe!
A serviçal saiu atropelando tudo pela frente, pois já sabia do mau gênio da patroinha e quando ela gritava assim com toda essa delicadeza rinocerôntica, melhor obedecer e rápido.
Tamborilando no encosto da poltrona, Abelarda continuava mirando-se no espelho e pensando em outras providências a tomar.
Lembrou-se da figura potente que comandava a guarda nacional, transformando frangotes em verdadeiros touros de briga. O professor de educação física Beloar Aparecido. Tocou a sineta e ordenou que o professor comparecesse na sala de reunião real na manhã seguinte.
Passou o resto da tarde dando cor nova a seus cabelos, tomando um banho demorado com sais de banho especiais vindos do Mar Quando Não Era Morto, fez uma massagem linfática para retirada das toxinas do corpo e a noitinha, já parecia outra mulher.
Satisfeita com seu reflexo no espelho gracejou imitando a famosa frase da rainha má:
-Espelho, espelho meu, existe alguém mais bela e poderosa do que eu em toda região de Pedra Ilustrata? – gargalhando diante de tal brincadeira, ela mesma respondeu:
-Claro que não! Ora pois! Não preciso da resposta de um espelho idiota para saber isso. Eu, Abelarda Mão Pesada, senhora real dos reinos de Pedra Ilustrata e Afins, sou a mais bela, a mais feminina, a mais astuciosa, a mais inteligente de todos os tempos. E ai de quem ousar me contrariar!
À partir de agora, inicia uma nova fase na história. A Era Abelardina.
Sonhando com seu promissor futuro de poderosa mulher, foi dormir o sono dos justos espalhando seu roliço corpo na imensidão do colchão real que por hora, tinha somente para si.

Para quem não leu o primeiro capítulo: Era uma vez

Era uma vez…

Alfredo Augusto era um ser estranho para os padrões masculinos de sua época.
Seu destino fora fadado e sacramentado no dia em que seu pai, convencido pela rainha Augusta Leocádia Suprema, decretou que sua vontade tinha de ser atendida: o nome de seu rebento seria Alfredo Augusto Pompílio Acertatus Certinhus Obedientis at Mamys Seráfico I.
Não podia dar coisa boa recebendo um nome desses não é mesmo? Não precisa nem mesmo ser vidente ou feiticeiro para prever tal desastre.
O pobre menino rico, desde a mais tenra idade tornou-se o “Insuportável” do reino da Pedra Ilustrata.
As crianças da nobreza só toleravam o infante por severas prescrições da rainha que ameaçou mandar degolar quem desfizesse de seu filho.
Conclusão: todos o toleravam revirando os olhos pelas costas a cada piti que Alfredinho dava. E olha que não foram poucos que deu em sua vida.
À boca pequena, todos comentavam no reino que esse menino não daria boa coisa, logo, não seria um bom candidato a herdar o reino das mãos do pai Tertuliano Boa Pinta. Um bom rei para o seu povo, contudo, nulo no seio familiar, totalmente dominado pela rainha megera.
Os anos se passaram e ao chegar à pré-adolescência, Alfredinho conheceu uma jovem que transformou sua vida: a nobre Abelarda Mão Pesada, filha primogênita do Visconde de Parar o Tempo e sua esposa Dorotéia Minguou.
Abelarda, linda jovem com madeixas negras e lustrosa feito noite mais densa do universo, trazia em seu rosto lunar, um par de esmeraldas em forma de olhos. Menina bonita, mas que tinha um anseio dentro de si que os pais não conseguiam dominar: não era nada feminina.
Mamãe Dorotéia descabelava sua peruca cada vez que via sua linda filha toda suja de terra e de vestido de renda nobre rasgado. E quando ela voltava de seus passeios descalça? Desgosto total!
Mas a nobre já traçava planos para assegurar o futuro de sua primogênita. Após muitas pesquisas online em sua futuríssima bola de cristal Esvarosvisqui 8.1, ficaram sabendo que o melhor partido para Abelarda seria o filho do rei Tertuliano. O petit se encaixava perfeitamente à personalidade dominadora e forte de Abelarda. Formariam o par perfeito!
Abelarda seria a continuação da mãemandona que ele necessitava.
Na primavera daquele ano não notificado, as famílias se reuniram para as devidas apresentações e futuras negociações do enlace.
De início se estranharam um pouco, mas logo perceberam o quanto poderiam dar certo em sua convivência.
De imediato, Abelarda percebeu o quanto Alfredinho era acomodado e mimado. Um “frescalhão”, pensou.
Perfeito! É do jeito que gosto. Vou deitar e rolar e esse bobão nem vai notar.
Alfredo, após algumas conversações com Abelarda, refletiu e chegou a seguinte conclusão:
Perfeito! É do jeito que gosto. Vou deitar e rolar, ficar de boa e essa “sargentona” fará tudo por mim. Estarei no céu!
O casamento foi um dos mais comentados por toda região e por muitos anos as pessoas do reino se lembravam daquelas noites memoráveis de muita festa e bebida à vontade para celebrar a junção das duas importantes famílias.
Os anos passaram num piscar de olhos e eis que o casal teve uma pimpolha que se tornou o centro das atenções do casal e das famílias reais: Anabela.
Menina de brilho interior intenso, olhos espertos, sorriso fácil, inteligente como poucos naquele reino.
O casal, como todo casal que se preze, envelheceu. Cada um a sua maneira.
Abelarda, após a gravidez adquiriu um corpo arredondado e seu rosto que já era lunar, ganhou formato de eterna lua cheia. Seios fartos, traseiro de chamar a atenção, uma pança que ganhava vida própria cada vez que gargalhava.
Alfredo, ao contrário de Abelarda, pouco a pouco perdeu peso e arcou sua estatura se transformando numa triste imagem de homem derrotado pela vida.
Cabelos ralos, olhos caídos, boca em eterna curva para baixo traçava o que ia em seu interior: muita melancolia, enfado, tristeza de viver.
Homem de índole frágil, incapaz de tomar qualquer atitude sobre qualquer coisa. Uma eterna sombra de sua esposa e agora, também estendida a sua filha.
Após a perda de sua progenitora, tornou-se amargo e jamais aceitou o novo casamento de seu pai. Tornara-se um revoltado.
Sua vida agora era se lamentar pelos cantos do reino. Não se interessava pelos assuntos da administração real, não tinha vontade em estudar Relações Internacionais, não tinha nenhuma diplomacia nem interesse de interagir com os demais reinos para alicerçar seu futuro como dirigente. Seu pai se lastimava por ter um filho tão apático, tão sem graça. Apostara todas as fichas em Abelarda, mas no fundo, bem lá no fundo, seu sonho era ver o filho governando de forma brilhante seu reino que cuidara com tanto amor.

Seu único interesse era passar horas jogando na sua telinha mágica. O mundo ao seu redor podia ruir que ele não estava nem aí. Em suas dependências íntimas, Abelarda, já farta de tanta paralisia e falta de ambição do cônjuge, confabulava um destino melhor para si e seu reino. Planejava o sumiço físico de Alfredinho. Um nulo que não faria falta a ninguém.

Farei um favor inclusive ao seu pai que morre a cada dia de desgosto por ter gerado um inútil feito ele. E também farei um favor para Anabela que sempre se constrange toda vez que trago um pretendente para futuro enlace.

A vida seguia normalmente no reino da Pedra Ilustrata. Um mês, três, seis, um ano se passa até que certo dia, durante um festejo alguém faz a seguinte pergunta:

-Gente por onde anda Alfredinho?

Todos param, se olham interrogativamente e logo um burburinho toma conta do local gerando uma preocupação generalizada entre todos inclusive, entre a família real.

-Pois é…Alfredinho, nunca mais tomou o café da manhã comigo, nem me chamou mais para acompanhar com ele um jogo Second Life – balbuciou o pai, o rei Tertuliano Boa Pinta olhando de imediato para Abelarda.

-É mesmo. Ele nunca mais me perturbou com seus comentários insuportáveis sobre minha banha na barriga e minha voz de barítono – falou Abelarda olhando para Anabela.

-Nossa! Papito nunca mais entrou de sopetão em meu quarto para me assustar ou soltar uma de suas inúmeras piadinhas sem graça… Há quanto tempo ele não é visto por alguém?

Tertuliano Boa Pinta convocou todos do reino para que saíssem a procurar de Alfredinho. Semanas se passaram infrutiferamente. Alfredo Augusto, herdeiro do reino de Pedra Ilustrata evaporou sem deixar rastro. Seu pai entrou em contato com as embaixadas solicitando que procurassem nos reinos vizinhos estipulando uma gorda recompensa. Houve uma verdadeira corrida do ouro sem que ninguém conseguisse resultado positivo. Aos poucos a vida foi voltando a sua normalidade e a figura de Alfredo Augusto Pompílio Acertatus Certinhus Obedientis at Mamys Seráfico I foi desbotando até que caiu de vez no limbo do esquecimento de todo o reino. Triste destino de quem veio a essa vida para passá-la em branco. O que terá acontecido de fato ao nosso herdeiro?

Nessa história eu não sei dizer o que houve com nosso personagem. Talvez possamos reencontrá-lo numa próxima. Posso contar com sua audiência e leitura?