Tenho estado tão fora da “casinha”, que esqueci a data de hoje. Não é ingratidão ou falta de sentimentos. Não é ausência de amor. Talvez seja a danada da consciência ditando regras para me proteger.
Pai, você por muitos anos, foi uma figura impalpável. Um homem que não se mostrava aos filhos. Por muito tempo, interpretei sua postura de forma equivocada. Julguei e condenei você inúmeras vezes. Acreditava ser um homem fraco e irresponsável.
Hoje, madura, reconheço sua humanidade repleta de virtudes e vícios. Reconheço-te frágil, pela vivência familiar que teve em sua infância e adolescência. A rigidez dos antigos, causou muitos males aos corações sensíveis. Não te compreenderam, da mesma forma que seus irmãos também não contaram com esse olhar mais cuidadoso e amoroso. Cada qual cresceu, feito erva daninha e foram se moldando conforme a vida lhes malhava. Houve estragos permanentes em todos.
Seu coração repleto de feridas abertas, encontrou conforto ao lado da mulher forte e centrada que foi mamãe. Ao lado dela, você encontrou um pouco da compreensão e amor, negados no passado.
Você tentou. Hoje compreendo que você deu seu máximo. Se para nós, seus filhos, não foi suficiente, não carregue culpas. Hoje compreendo o quanto é penoso criar filhos. Tarefa pesada e repleta de cobranças.
Sinto imensamente sua partida precoce. Se vivo, hoje, seríamos grandes amigos. Você sentiria muito orgulho de mim, sua “turquinha” como carinhosamente me chamava.
O que me consola, é que em seus últimos meses de vida, estreitamos nossa convivência. Nos conhecemos melhor, desnudos de máscaras sociais. Apenas dois seres humanos na companhia um do outro.
Onde você estiver, desejo luz e acima de tudo, paz de espírito. Tesouros preciosos que em vida, nunca conseguiu conquistar.
Que pena, não tenho nenhuma foto ao seu lado. Também, somos de uma geração onde não havia smartphones, muito menos, a cultura de selfies para exibir nas redes sociais. Vasculhei o baú de fotos, na casa de mamãe, só encontrei essas fotos desbotadas e desfocadas. Fruto de mãos destreinadas e falta de preocupação com qualidade de imagem.
Os registros fotográficos podem estar apagados, mas, o sentimento de filha, mantem-se vívido, nítido e colorido.
Abenção meu pai!
Esse texto faz parte do b.e.d.a — blog every day august.
Participam Adriana Aneli — Claudia Leonardi — Darlene Regina – Lunna Guedes – Mariana Gouveia — Obdulio Nuñes Ortega
Imagens: acervo pessoal