Na década de 80, uma pessoa se ofereceu para fazer minha numerologia. Duvidei, tentei desviar, me fingir de morta mas, não teve jeito. Ela, de posse de meus dados do nascimento e hora, em poucos dias me apresentou o resultado.
Após meus olhos passearem por várias informações tipo: nome do meu anjo protetor, blábláblá… Eis que me deparo com as possíveis carreiras nas áreas a seguir: arquivos, bibliotecas, museus e educação.
Soltei meu riso de escárnio e ao chegar em casa, meu primeiro impulso foi jogar fora aquele monte de papel, mas, como boa canceriana, guardei numa caixa de documentos e ali permaneceu por muitos anos.
Naquela década, fui uma total sem noção. Ora assumia a fantasia de perua no salto Czarina 15, vestida de mini vestido e blazer com ombreiras gigantescas, ora me transformava em gótica e saía desbundada pela city.
Trabalhava numa semiescravidão não percebida, na rua da Consolação. Após horário, circulava pela rua Augusta até tarde, descendo para o centro de São Paulo, onde tomava o ônibus para regressar para casa. Cruzava com várias tribos urbanas da época: punks eram os que mais encontrava, emos, góticos e outros tresloucados que habitavam as ruas. Nunca tive problemas com nenhum deles.
A década deu pulos de atleta e chegamos ao ano de 1995. Muitas águas rolaram por debaixo dos rios canalizados de Sampa. De artista plástica, a professora de língua portuguesa, arquiteta, design de interiores, minha vida profissional desaguou em águas biblioteconômicas na área educacional.
De lá pra cá, nunca mais me separei desse companheiro constante: o livro. Ou devo dizer que fui infiel e travei contato e vivi cercada por inúmeros, centenas, milhares de livros? Acredito que fui e permaneço a infiel mais fiel a alguém pois jamais, em hipótese alguma, troquei o(s) livro(s) por nenhum outro objeto ou ferramenta ou sei lá o quê. Ao lado dele(s), vivi experiências únicas, amei intensamente, conheci lugares, pessoas, filosofias. Tornei-me mais humana, mais experiente, mais sábia.
Hoje, 23 de março, data em que se celebra, homenageia, difunde a importância dele, deixo aqui meu depoimento do quanto sou grata pelo convívio com ele(s) e o quanto sou feliz em também poder escrever e transformar meus pensamentos e textos em livros. Ah, ainda sou grata pela possibilidade de ter conhecido e feito amizades duradouras através dos livros e da escrita.
Perceberam que a moça que fez meu mapa astral acertou na mosca? Sem querer, querendo, direcionei minha vida para a área educacional e trabalho em uma biblioteca até hoje. Cercada carinhosamente por livros e crianças e adolescentes incríveis.
Sou ou não sou feliz?
Esse texto faz parte da blogagem coletiva BEDA (Blog Everyday April).
Participam comigo:
Alê Helga – Claudia Leonardi– Lunna Guedes – Mariana Gouveia – Obdulio Nuñes Ortega – Suzana Martins