Escrever tem sido experiência gratificante nesse um ano e meio de pandemia. Se antes já escrevia por prazer, agora, escrevo como forma de me alimentar e manter a saúde mental e emocional. E essa tarefa tem sido gratificante. Além de ter publicado o livro em forma de diário Equação infinda, parte do projeto Diário das 4 Estações, participei dos coletivos Casa Cheia e Casa de marimbondos. Todos promovidos e lançados pela Scenarium Livros Artesanais, de Lunna Guedes e Marco Antonio Guedes.
Os livros artesanais são personalizados e estão cada dia mais bonitos. Com projeto editorial moderno, participo no Casa cheia com os seguintes textos: Encapsulada, Literatura, leitura, preconceito, Ser mulher e Um novo passo.
Casa de marimbondos foi um convite irrecusável que a editora Lunna Guedes fez para alguns escritores. Lançou um primeiro capítulo, apresentou um cenário e personagem e, cada um, deu continuidade a história desenvolvendo um personagem que interagiu com a personagem do primeiro capítulo. Esse desafio foi uma gostosa provocação e dele, surgiram personagens incrível e a história ganhou corpo. A obra recebeu belas ilustrações da artista Carly Ca que enriqueceram muito o trabalho coletivo.
Fiquei muito satisfeita com o resultado e convido a todos que ainda não leram, a conhecer essas obras que fazem parte do Clube Scenarium 8 que serão 8 edições no ano. Conheça essa e outras tantas novidades que a Scenarium Livros Artesanais tem em seu catálogo.
Minhas prateleiras são bem diversificadas e equilibradas. Na hora da escolha, fiquei em dúvidas sobre qual escritora escolher para essa maratona. Fiquei temerosa de injustiçar as demais afinal, todas que fazem parte de meu acervo são excelentes escritoras.
Optei por essa, que há alguns anos foi uma agradável descoberta. Livro adotado para os alunos do Fundamental II. Por ouvir tantos comentários positivos – deles que nunca gostam dos livros escolhidos para leitura obrigatória -, decidi ler também. E me encantei!
Minha vida de menina, escrito por Helena Morley, lançado pela Companhia de bolso. Narra a vida de uma adolescente no final do século XIX. Em formato de diário, escrito à margem da literatura, apresenta o dia a dia de uma menina do interior, de catorze anos, cujo incorformismo sem rótulos resulta do mais autêntico humorismo – displicente, impiedoso, sem cerimônia -, colocam essas memórias nos antípodas do tom acadêmico e do beletrismo e vêm-nas antes aparentar com a literatura picaresca… (Alexandre Eulálio)
Considerado um livro que já nasceu clássico, a história mostrada pelos olhos da jovem autora, nos apresenta um Brasil colonial muito bem retratado numa Diamantina do fim do século que atravessava um período de decadência econômica bastante grave.
A jovem Helena nos apresenta um livro para ser lido sem pressa. Expõe os costumes da sociedade em que viveu numa prosa coloquial deliciosa. Minha vida de menina vale também, de um ponto de vista particular, como a evocação do pequeno mundo antigo, no momento em que a velha sociedade patriarcal ainda não se desintegrou e parece manter intactas todas as suas coordenadas. Não tem como ler e não encontrar muitas relações e situações com nossa realidade em pleno século XXI. Será que nosso Brasil evoluiu? Só lendo, se divertindo com Helena e refletindo para se chegar a uma conclusão.
Deu vontade de reler novamente. E você, já leu esse livro? Me conta!
Esse texto faz parte da Maratona Literária Interative-se de Maio e, estão comigo nessa corrida:
O núcleo familiar sempre nos oferta grandes personagens. Cada qual com seu perfil, comportamento, esquisitices. A relação mãe e filha já foi retratada em muitos romances. Alguns, tornam-se inesquecíveis.
Minha última leitura, me deixou pensativa assim que terminei. Muitas das personagens, identifiquei em minha própria família daí, a identificação.
Agora chega!, primeiro livro de Iohanna Ca, aborda as questões delicadas que compõe a trama da família Carvalho.
Narrado em primeira pessoa, a personagem Elisa, abre seu baú de lembranças e coloca na mesa as peças que fizeram de sua vida – desde que nasceu -, um inferno na terra. Você pode ler a resenha que fiz aqui.
Publicado pela Scenarium Livros Artesanais, é um livro elegante, gostoso de manusear mas principalmente, potente. Uma história que nos faz muitas vezes, ao longo da leitura, dizer em voz alta: Agora chega!
Esse texto faz parte da Maratona Literária Interative-se de Maio e, estão comigo nessa corrida:
Acompanho a carreira de Daniel Lopez Guaccaluz desde a época do curso de criação literária que fizemos juntos, em 2010. De lá para cá, adquiri seus livros e li todos. Gosto demais de sua narrativa.
Seu primeiro livro publicado, Pianista boxeador, é uma coletânea de contos, lançado pela Confraria do Vento em 2011.
Em 2013, lançou seu primeiro romance, Fruta e a seguir, A delicadeza dos hipopótamos, pela editora Terracota. No céu com diamantes e Ménage a trois, lançou pela Alink Editora.
E esse ano, adquiri seu livro mais recente, Geraes, lançamento da Lavra Editora.
É uma saga familiar,
história fantástica de um mundo povoado por anjos,
demônios, encantamentos, ou ainda uma sensível história de amor, contada num poema prosa?
É um pouco de tudo isso. Escrita com coragem, vísceras, fibra e alma.
Um encantamento imperdível.
Como sempre faço ao receber os livros que compro, mergulhei no universo de Guaccaluz, já sabendo que me surpreenderia, como sempre fez.
“Cabelos raspados, tatuagens nas costas…Tinha um quê de anjo, onça machucada…Havia anos que partira para as capitais com o intuito de cantar… Voltava devido ao falecimento de sua mãe, Catarina, que suicidara”.
Uma aventura por dentro de uma família e suas histórias e personagens. Um passeio por Minas e suas cidades ricas de seres mitológicos e, por isso mesmo, repletos de humanidade.
A linguagem trabalhada, as referências filosóficas, as citações musicais são marcas de seu trabalho literário. É um escritor que sempre recomendo.
Vale muito a pena conhecer o universo literário desse professor, jardineiro e escritor – como ele mesmo se intitula.
Vale ainda salientar a bela editoração do livro e as delicadas ilustrações e projeto gráfico de nosso já conhecido colega de blog e escritas, Managon.
E você, já leu algum livro de Daniel Lopes Guaccaluz?
Esse texto faz parte da Maratona Literária Interative-se de Maio e, estão comigo nessa corrida:
O ano de 2020 foi peculiar em muitos aspectos inclusive, em minhas leituras.
Por força da profissão e amor a leitura, todo ano costumava ler muitos livros. Infanto-juvenis, romances, suspense, contos, crônicas, ensaios.
Com a chegada da quarentena, presa em meu apartamento e sozinha, tive de me contentar com o que tinha em minhas estantes. Por sorte, trabalhando de forma remota, trouxe algumas caixas repletas de livros para analisar, fazer uma leitura técnica e registrar no acervo da biblioteca em que trabalhava.
Conforme foram passando os dias, arrastada pela monotonia e da conscientização da gravidade do que passávamos, fui ficando com meu foco na leitura comprometido. Iniciei vários livros e acabava abandonando-os pelo caminho.
Talvez esse comprometimento tenha acontecido pelo excesso de informação obtida através da internet e das redes sociais. Muitas lives a sobrecarregar a mente com tantas informações – o que na maioria -, conscientizei-me depois, desnecessárias. Parei com tudo!
Acalmando a mente e as emoções, avaliei o que tinha aqui comigo em minha estante e selecionei o que gostaria de ler de fato.
Acredito que foi o melhor que fiz e eis abaixo, minha lista de leituras de 2020, o ano que não aconteceu e ainda não terminou!
Ah, fora os livros da Scenarium Livros Artesanais que aproveitei para ler alguns que ainda não havia lido por falta de tempo ou reler outros que gostei muito.
Esse texto faz parte da blogagem coletiva sobre o tema “As leituras de 2020”, proposta por Lunna Guedes.
Quando soube do lançamento desse livro, fiquei curiosa. Organizado pela também escritora Luciana Iser Setúbal em parceria com o Clube da Escrita para Mulheres e a Editora Penalux, essa reunião de contos se materializou num belo livro.
Foi uma surpresa a cada texto lido. Escritoras que já conheço como Márcia Barbieri – no qual citei um livro numa postagem anterior -, Maria José Silveira, Aline Viana, Nanete Neves, Sonia Nabarrete, a própria Setúbal e Maria Esther Sammarone. Mas conhecer escritoras novas (pelo menos para mim) e mergulhar em seu estilo literário foi uma feliz atividade. Todas exploraram o universo feminino na fase madura onde a vida sexual já declinou. Contudo, sabemos que continuamos a sentir desejo mesmo que a carne se torne flácida, que as rugas fixem moradia em nossos rostos, que os cabelos se platinem, o desejo e a vontade de atrair o olhar do outro (ou outra) permanece latente. Na realidade o que acontecia até bem pouco tempo, era sufocar o tesão e a vontade de continuar se relacionando porque segundo as convenções sociais, não era de bom tom uma mulher madura sentir “vontades”. Tinha de morrer em vida.
Hoje, o perfil da maioria das mulheres mudou. Assumiram as rédeas de suas vidas e desejos e fazem o que querem, como querem e com quem querem. A mulher atual, mesmo que assuma suas madeixas brancas, não tem mais a postura das avós ou tias do passado. O fato de se cuidar, bancar seus desejos sexuais, fazer suas próprias escolhas ao invés de esperar ser escolhida, faz toda a diferença. Nessa bela antologia, conheci mulheres incríveis (personagens e escritoras) que me transportaram para histórias deliciosas, alegres, otimistas, engraçadas, melancólicas, humanas.
Num momento em que feminicídio
tornou-se notícia diária, resgatar a importância da mulher, tornou-se
fundamental. Discutir o feminino, urgente. Ler escritoras e saber o que cada
uma tem a dizer, mais que necessário.
Debater os direitos do sexo feminino,
suas necessidades físicas, psicológicas, materiais, sentimentais, sempre será
matéria a ser discutida.
Fiquei encantada com o poder literário de todas as escritoras presentes na antologia. É um livro para ser lido por todos. Já aguardo um volume dois.
Lançado pela Editora Penalux, o livro
tem um belo tratamento gráfico. Capa do competente Ricardo A. O. Paixão (sou
fã). Quem já leu outros livros dessa editora, conhece seus trabalhos. Parabéns
a todos os envolvidos nesse belo projeto!
A leitura faz parte de meu cotidiano há muito tempo e posso dizer que já li praticamente de tudo: de revista de banca de jornal Sabrina, passando por romances mediúnicos, namorando romances best seller como os de Sidney Sheldon e Danielle Steell a livros de filosofia, psicologia, biografias.
Ah claro, li alguns romances eróticos também. Nunca tive problemas em ler em público, contudo, três livros confesso que li na surdida. Bem escondidinho.
O primeiro, foi um clássico de nossa ficção científica do autor que hoje – apesar de esquecido no limbo -, é altamente cultuado pelos amantes do gênero Ficção Científica: André Carneiro.
O livro Amorquia, eu encontrei por acaso numa liquidação na livraria Nobel da rua Maria Antonia. Fazia faculdade e era caminho. Sempre estava por lá garimpando boas promoções. Algo nesse livro chamou minha atenção e não hesitei. Comprei.
Não conhecia o autor e muito menos a história do livro logo, foi um mergulho noturno no lago negro. Considerada uma utopia-anarco-erótica (palavras de meu mestre Nelson Oliveira), nos apresenta uma sociedade hedonista onde as crianças têm aulas de prática sexual desde cedo e a religião reforça o tempo todo o sentido sagrado do prazer carnal. A morte e o trabalho foram abolidos assim como o amor, o casamento e a fidelidade. Confesso que página a página lida e virada, um incômodo fez moradia dentro de mim. Não sou puritana, mas a maneira como o sexo é tratado na história me causou mal-estar e passei a ler cada vez mais escondido com medo que despertasse a curiosidade nas pessoas ao meu redor. Apesar de tudo, cheguei ao final do livro e tenho de dizer, fiquei muito satisfeita. Tanto que indiquei sua leitura a várias pessoas e emprestei inúmeras vezes até que simplesmente sumiu. Quero comprar um novo exemplar e fazer uma nova leitura. Atenção esse livro você encontra somente em sebos.
Anos mais tarde, fazendo um curso de criação literária, numa discussão sobre literatura erótica, observei que não havia lido nada. Decidi ler alguns títulos sugeridos pelo professor.
O livro escolhido foi A história do olho, de Georges Bataille. Não se enganem ao se deparar com um livro de apenas 144 páginas. A história mexe, incomoda, te faz perder o rumo muitas vezes, te dá tesão em outras. O livro me fez refletir sobre os personagens e sua condição humana em busca de se afirmação – seja no sexo e sua descoberta, na vida, na sociedade que tanto nos cobra determinada postura, mas nos afronta e nos oferece outras. Vivemos no fio da navalha entre o politicamente correto e o que nos proporciona prazer.
Ah, mas não parei aí. Recentemente, li uma obra escrita por uma querida escritora com o qual tenho amizade que muito bagunçou minha vida de leitora: o livro?
A puta, de Marcia Barbieri. Só pelo título já dá o que pensar, mas a escrita mordaz e afiada feito uma lâmina de aço de Márcia, nos incita a seguir com a leitura. Numa linguagem visceral, ela retorce nossas vísceras e nos faz parar e pensar ou simplesmente parar e ficar no vácuo de suas palavras. É, desde que a conheci no curso de criação literária, uma voz que ecoa e que faz diferença nesse mar de mesmice literária atual. E claro, com esse texto, com esse título e capa, confesso que ficava incomodada (mais uma vez essa palavra) em ler em público. Daí, ler escondidinha no escurinho de meu quarto.
Enfim, os três livros de maneira muito diversa, mas abordando o tema sexo, vida, amor, morte, mexeu absurdamente comigo e isso faz deles, três grandes livros afinal, literatura para mim é isso. Tem de mexer e remexer nossas entranhas caso contrário, em nada contribui. E você já leu algum deles? Me conta!
O ano de 2018 foi corrido em vários sentidos (profissional, pessoal) e muito profícuo na leitura. Quem me conhece sabe que vivo cercada por livros. Além de bibliotecária, sou amante do objeto livro e sempre leio mais de um por vez. Contudo, ando em falta em comentar sobre tais leituras. Uma decisão tomada nesse início de 2019 é justamente expor minhas impressões sobre as leituras feitas.
Para iniciar, vou falar sobre um livro que chegou a mim através de um dos blogs que sigo por aqui: RUBEM – revista da Crônica
Organizado por Rubem Penz, Caio em mim, é uma homenagem do grupo de escritores do projeto Santa Sede, coordenado pelo próprio Rubem. Quando li a postagem sobre o lançamento desse livro, fiquei bem curiosa, uma vez que sou apaixonada por Caio F. Encomendei o livro e fiquei na espera de sua chegada. Encantada com a beleza gráfica do livro.
Bela capa
Convite à leitura não?
Não é lindo? Olha ele te chamando à leitura
Após apreciar todo o trabalho gráfico, iniciei a leitura da coletânea e confesso, mergulhei toda noite antes de dormir e me emocionei muito a cada crônica terminada. Conhecer a escrita de escritores que não conhecia foi bom demais! Alguns já tinha lido algumas crônicas na página da Rubem porém, conhecer o lado Caio F. de cada um foi uma experiência única. Tenho certeza que todos que participaram desse projeto saiu mais experiente na arte de tecer histórias e criar personagens. Eu, enquanto leitora, saí mexida no bom sentido e com o espírito balançado diante da delicadeza e talento de cada um do grupo Santa Sede. Se você, assim como eu, é amante da escrita de Caio, deve conhecer esse trabalho. Se ainda não conhece, vale do mesmo jeito. Leia! Abaixo, tomei a liberdade de reproduzir um trecho do texto de Rubem Penz que praticamente abre a coletânea:
Se um cronista numa noite de terça-feira…
Suponha que Caio F. chegue à mesa numa terça-feira de 2018. Não se espante: suponha, apenas, que você não esteja só – ao contrário, tenha muita gente em sua companhia. Por fim, suponha que ninguém,você primeiro, estranhe essa chegada aparentemente tão pouco possível para uma noite de terça-feira num bar da Cidade Baixa em Porto Alegre, em que chove uma chuva fina ali na rua, na qual um mendigo sagitariano se esqueça de si e nem cogite lembrar-se de nós.
Dessa forma, assim como se fosse a coisa mais natural do mundo, chame o garçom e faça uma enquete sobre o que oferecer ao recém-chegado. O Felipe, creio, indicará um uísque. Ronaldo, um chope artesanal. Eu, o André e o Gian convidaremos a nos acompanhar na cerveja, ao que o Edgar pulará na frente: pago uma Coruja! Bebendo pelas beiradas, a Ana Luiza e a Patrícia sussurrarão um vinho ao seu ouvido, enquanto Camila dirá ser água a melhor pedida. Gabriel, que tem nome de anjo, um café, quem sabe um chá… Refrigerante parecerá a todos fora de questão – Caio F. não teria vindo de tão distante no tempo para beber água doce.
Não pergunte nada. Deixe as três marias – Isabel, Mercedes e Amélia – suponham que Caio F. trouxe um conto inédito para ler só para elas;…
Gostou do que leu até aqui? Ficou curioso(a)? Então vá atrás, compre o livro assim como eu e se delicie nas crônicas contidas nesse belo livro. Será uma experiência inesquecível! Eu garanto! Quer conhecer mais textos deles? Vá a página da revista.
Em tempo, os autores que participam dessa coletânea: Felipe Basso, Giancarlo Carvalho, Maria Isabel Arbo, Patrícia Franz, André Hofmeister, Maria Amélia Mano, Michele Justo Iost, Gabriel Lesz, Edgar Aristimunho, Maria Mercedes Bendati, Camila Z., Ana Luiza Rizzo, Rubem Penz, Clarice Jahn Ribeiro e Ronaldo Lucena. Com participação de Vitor Melo Ferreira Filho, como Caio F.
Em plena manhã ensolarada, uma tormenta se aproxima de mim e em pouco tempo, deságuo. Tento disfarçar minha umidade, mas não obtenho sucesso e as pessoas ao meu redor começam a olhar e comentar baixinho entre si. Outras, mais discretas apenas me olham de soslaio e abaixam a cabeça ou desviam o olhar atravessando a janela do coletivo perdendo-se na paisagem urbana. Uma dor que não consigo medir nem descrever toma conta de meu peito que parece pequeno para acomodar um coração que está prestes a explodir. Estarei enfartando penso eu num breve momento de lucidez. Estarei prestes a morrer? Tantos morrem seguindo para seu trabalho. Farei parte dessa estatística?
Uma sirene grita pedindo que abram espaço num trânsito transbordando de tantos tanques urbanos que tomam espaço de três carros na avenida. Os motoristas olham-se assustados, irritados, pois não tem pra onde sair para deixar a ambulância passar. Seu grito continua ecoando fazendo trilha sonora ao meu sofrimento. Choro e minhas lágrimas quentes abrem brecha numa esperança de servir de caminho para aquele que tenta sobreviver dentro da ambulância. Inútil eu sei, no entanto, prefiro pensar que ajudo de alguma forma a salvar uma vida.
Quero parar de chorar mas não consigo. Para completar, o ônibus faz uma parada num ponto em frente ao cemitério Redentor e uma canção começa a tocar no rádio Say a little prayer for you…
A tormenta volta com força total e me encolho no canto próximo à janela numa tentativa de tornar-me invisível. Parece que absorvi toda dor existente no mundo e meu peito não tem espaço suficiente para abarcar tamanha dor.
– Moça, moça, tudo bem? Já chegamos à Avenida Paulista. Ponto final. Sei que desce sempre aqui. Todo mundo já desceu.
Com muito esforço saio da neblina que me encontro e ainda com dificuldades em respirar, retorno à realidade. Agradeço o cobrador por se lembrar de mim e me avisar. Desço e tropegamente inicio minha caminhada até a empresa onde uma série de atividades me aguarda. Preciso recuperar a lucidez e despir a vestimenta de carneiro. Pelo menos por hora, voltar a ser humana.
Marcelo Maluf, você foi o responsável por esse “mico” que paguei em plena luz do dia por volta das 8h43 da manhã dessa quarta-feira. Mais pessoas engrossarão o cordão dos que me acham doida por cantar e chorar e ler e voltar a cantar e chorar em público. Lendo o seu livro recém-lançado A imensidão íntima dos carneiros, me catapultou para uma realidade lindamente dolorosa e sofri toda a dor de seus antepassados que nada mais é, que a dor de toda a humanidade condensada nos seus. Você teve o dom de me transformar em um dos carneiros e pude vivenciar todo esse universo de sensações e dores que fazem de nós, medonhamente humanos.
Você fala no medo que é matéria palpável em todos que passamos por essa vida terrena e isso, torna seu romance universal. Parabéns! Tenho certeza que ele será compreendido em todas as nacionalidades que ele porventura venha a ser traduzido. Sua linda história familiar já é um sucesso por ter sido tramada com pontos tão finos e delicados que mesmo um ogro, ao ler suas páginas, verão seus corações empedernidos desmancharem com tamanha beleza e verdade. Ainda agora, de frente a tela de meu computador no trabalho, escrevendo essas linhas finais, emociono-me. O belo também nos faz chorar!