Exótica?

minhas unhasPercebi com a visão periférica que ela olhava minhas mãos que preparavam um café na máquina expresso. Observava que seus olhos acompanhavam cada gesto que elas faziam.  O que a princípio foi motivo de graça para mim, com o passar dos segundos, foi gerando uma irritação. Pensava com meus botões que tanto ela olhava.

Até que, quando finalmente peguei minha xícara fumegante de expresso extra forte, com um aroma que envolvia todo o ambiente, eis que ela solta a pérola:

– Diferente seu esmalte… Suas unhas ficaram… Exótica…

Parei com a xícara no meio do caminho. Pretendia dar um bom gole afinal, pela manhã não sou ninguém antes do primeiro café. Olhei para ela com expressão de interrogação. Olhei para minhas unhas tão bonitinhas pintadas de lilás clarinho da Colorama, coleção Aquarela Tropical. Uma delicadeza só. Tive o maior trabalhão para fazê-la ontem à noite e essa figura vem e me fala que está…Exótica? O que posso compreender por Exótica?

Como já dizia minha sábia avó Maria, “para um bom entendedor, um pingo é letra” e eu já deduzia que ela estava tirando onda com a minha cara afinal, a tal criatura não sabe elogiar. Só tem boca para criticar e falar mal dos outros.

Totalmente de guarda em pé, sorvendo minha dose diária de cafeína, passei a também medir e observar cada centímetro da talzinha que falou de minhas unhas (tão lindinhas!) e achei suas unhas bem… como dizer?

Comuns! Masculinizadas. Curtinhas e desbotadas na sua cor natural. Pensei com meus grãos de café torrados que peguei para mastigar: deve ser anêmica a pobre. Não tem cor saudável ou, tem micose. Podia tratar melhor suas mãos!

Ela, a figura em questão que agora era alvo de minhas olhadas, foi ficando sem graça. Para disfarçar, resolveu pegar um café também e passou ao ritual de pegar o copo descartável, posicionar na cafeteira, escolher quantos grãos queria, pingou algumas gotas de adoçante e acionou o botão para o feitio da adorada bebida.

Sorvendo o meu que a essa altura já estava frio,posicionei-me bem a seu lado, quase num corpo a corpo e não tirava os olhos de suas mãos. Exatamente como ela fez comigo e amei (confesso) ver que ela ficava mais e mais sem graça com minha conduta digamos, nada amistosa.

Hoje é dia de confissão então faço mais uma: sou boa, mas quando estou na gira, socorro! Fico melhor ainda! Trocando em miúdos: Fico simplesmente insuportável!

Coitada! Sua saia justa foi sufocando-a até que acabou por engasgar com a bebida e saiu correndo para o banheiro.

Sentei em minha cadeira e gargalhei de prazer com o troco que dei afinal, chamar minhas unhas pintadas de lilazinho da coleção Aquarela Tropical de Exótica, é o mesmo que dizer que estavam uma bosta de feia. Não aceito! Prontofaleievinguei!

– Carolina de Deus, você viu o que aconteceu com a Marcelina? Coitada, se engasgou tomando café e tiveram que levá-la para o hospital. A pobre estava lilás de tanto que estava sem ar. Pode até morrer, judiação! – dando-me essa notícia de sopetão,  Rutinéia saiu correndo para espalhar a notícia para todo o departamento. É nossa jornalista da Rádio Pião sempre nos informando em primeira mão.

Pensativa diante da notícia, uma ideia começou a corroer meu íntimo.

Serei uma bruxa? Terei poderes sobrenaturais e não sabia? Sabe, sou ruim às vezes mas, no geral sou gente boa. Sangue bom, entende? A Marcelina é mala sem alça no entanto, não desejo seu mal. Nem de ninguém. Poxa, a pobre ficou lilás de tanto engasgo. Caraca, devo ter um puta olho grande e nem sabia! Preciso cuidar mais de meus pensamentos e desejos.

Com essa decisão tomada, levantei e fui passar mais um café. O dia prometia.

E não é que caprichei nas minhas unhas! Estão lindinhas!

Imagem: Acervo pessoal

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