São tantas as vozes que falam simultaneamente que quando o silêncio se faz presente, causa-me estranheza.
Há algum tempo venho sofrendo com essa multidão falando ininterruptamente dentro de mim. Às vezes chego a pensar: Meu Deus! Quantas Roseli existem dentro de mim? Por que falam tanto e ao mesmo tempo?
Sinto-me cansada.
De repente, do nada se fez silêncio dentro de mim. E reverberou muito mais que qualquer falação Rosilesca que já ouvi.
A princípio estranhei, me preocupei. Achei que estava doente.
Depois os dias foram passando e fui me acomodando nessa serenidade anormal e tomando gosto por isso.
Uma semana se foi, duas semanas, três. Entrei em pânico. Comecei a me deprimir. Sentia-me solitária.
Por que o silêncio causa tanto medo no ser humano contemporâneo? Já percebeu que ninguém fica hoje sem um fone de ouvido? Tenho amigos que até para dormir, dormem de fone de ouvido. Fazemos parte de uma geração que simplesmente não consegue ficar em silêncio e no silêncio. Angustia! Incomoda!
Tenho uma irmã que é incapaz de ficar dentro de casa em silêncio. Sem nada ligado. Fica histérica se o rádio, a TV estiverem desligados. Ela liga o rádio da cozinha e dali a pouco sai. Vai para a sala, liga a TV e dali a pouco vai para a área de serviço lavar roupa, limpar a casa e deixa os aparelhos ligados.
E assim, vamos vivendo, ensurdecendo e não prestando a devida atenção a nada nessa nossa fútil vida.
Ouvimos tantos sons e no entanto, somos incapazes de apreciar um belo canto de pássaro, o ruído das águas numa cascata, o som da maré numa bela praia. Que por sinal, quase já não existem. E quando estamos numa praia observamos tudo, menos a beleza natural e seus sons. Ficamos ligados nas conversas paralelas, nos grupos de paqueras que rolam na areia, nos corpos repletos de celulite das mulheres que teimam em pagar mico, nos biquínis mais in e on que desfilam todos os anos. Mas dificilmente prestamos atenção aos sons naturais. Dos pássaros passando em grupo, no som mântrico das ondas que vem e vão, no som dos cascalhos pisados,na paz que toda essa paisagem nos trás.
Perdemos tal capacidade. Anestesiamos nossa audição e nos tornamos o animal mais sem percepção do planeta. E ainda temos a pachorra de se autointitular Animais Racionais! Valha-meDeus!
Mas retornando ao meu minúsculo universo, continuo um pouco perdida em mim mesma procurando aqui e acolá, minhas várias vozes. Anseio por companhia. Desejo barulho interior. Meditar? Desisti. Isso é para os fortes, os que já galgaram degraus da elevação espiritual.
Estou longe disso. Sou ainda muito Terra para alcançar tal plenitude. Os atabaques ainda me são necessários.
E falando em atabaques, voltei a sentir meu coração bater mais forte. Hoje, me emocionei ao ouvir uma canção de Ryuichi Sakamoto. Ela despertou um pouco de minhas sensações que até então se encontravam anestesiadas. Através dela, pude voltar a ouvir de fato prestando atenção a tudo. Ao som de cada instrumento tocado, cada nota, cada espaço.
Foi bom demais! Voltei a me sentir gente e não um simples autômato de carne e osso.